O Douro pelas lentes do mestre

16 Setembro | 2015 | Goodyear

Conhecemos “Vale Abrão”, o mais galardoado filme do mestre Manoel de Oliveira, no Douro vinhateiro

“Vale Abrão”, o mais conhecido e galardoado filme de Manoel de Oliveira, é uma obra de amor não só pelas palavras de Agustina Bessa-Luís, a autora, mas também pela luz que brilha nas vinhas do Douro. A história da Bovarinha não seria a mesma sob o olhar de outro realizador, mas nenhum outro conseguiria filmar esta terra com o respeito e a sensibilidade do falecido mestre. Façamos uma breve viagem sobre as imagens e locais mais marcantes do filme.

Se não se recorda, “Vale Abrão” conta-nos a história de Ema, original personagem de Flaubert que Agustina transfere para o séc XX. Em criança vivia no Romesal, numa casa de lavradores, a poucos quilómetros da Régua e, só depois de se casar, muda-se para Vale Abrão, onde o vinho do Porto conduz os destinos. É no triângulo destes três locais que se desenrola a narrativa até ao seu trágico final, e é a partir da varanda da sua casa de infância que Ema vê Vale Abrão e imagina uma vida que nunca chega a ter. A casa usada para o filme é, curiosamente, aquela que fica em frente à casa onde viveu Agustina, em Godim.

O Douro vinhateiro - Quilometrosquecontam

Da realidade para a película

O grosso das filmagens decorreu na Quinta da Pacheca, cujos proprietários viviam originalmente em Vale Abrão, num outro solar que, com o sucesso da produção vinícola da Pacheca, foi perdendo destaque. A casa foi destruída pelo fogo em 2004, mas no local foi construído o Aquapura, um hotel de cinco estrelas, um dos mais luxosos da região.

A Quinta da Pacheca é um clássico exemplo das famílias do Douro vinhateiro, abastadas, com uma relação forte com a terra e o vinho ao longo de várias gerações. É no seu alpendre que se desenrolam alguns dos diálogos mais marcantes do filme e onde Oliveira se apaixonou pelo vermelho das ramadas que caem sobre a varanda. É também no pomar que ladeia a casa que se filmou a tão conhecida cena de Leonor Silveira a surgir por entre as laranjas.

Em contraste literário com Vale Abrão, situada no alto de uma escarpa, a Quinta do Vesúvio é outro dos locais chave do filme. O local também existe e é um reconhecido produtor de vinho, com o Vintage de 1994 a ser bastante procurado e a alcançar bons preços entre os conhecedores de Porto. Aqui era a casa da “Ferreirinha”, fidalga do Douro, conhecida no séc. XIX e que aqui recebia os seus amigos e gente de relevo da época.

O Douro de Manoel Oliveira - Quilometrosquecontam

Antes que este Douro desapareça…

Lamego é referida por várias vezes ao longo da acção, não só porque é ali que acaba o vale que do Douro se estende como um braço, mas é aqui que Ema janta com pai durante as festas de Nossa Senhora dos Remédios e ela vê Carlos pela primeira vez. Apesar do tom sombrio que já sabemos ter este encontro, Lamego é tudo menos trágica. Muito pelo contrário, é uma cidade acolhedora que merece bem uma demorada visita, como as referidas festas o demonstram.

Todos estes locais podem e devem ser conhecidos, tanto o Vesúvio como a Pacheca estão de portas abertas aos visitantes e continuam a oferecer vinhos de elevadíssima qualidade. Da mesma forma, a obra-prima da dupla Oliveira/Agustina merece ser revista vezes sem conta para se entender a sua actualidade. Também agora, este Douro é uma paisagem que não se repete e que nunca voltaremos a ver. O tempo aqui passa devagar, mas passa.

Good Year Kilometros que cuentan