São Jorge, um dragão e os segredos das fajãs

9 Junho | 2017 | Goodyear

A Ilha de São Jorge tem lagoas paradisíacas, escarpas assustadoras e um povo que nos mete à mesa o melhor da comida açoreana. Saiba o que ver e visitar.

São Jorge, a mais central das ilhas dos Açores, mantém-se uma ilustre desconhecida para muitos dos visitantes do arquipélago enquanto São Miguel, o Faial e até mesmo o Pico captam a maioria das atenções. Mas é, a todos os títulos, uma injustiça tremenda: São Jorge tem muito mais do que o queijo que a tornou famosa e está repleta de pequenas enseadas, curiosas fajãs e encostas abruptas que a tornam uma pequena caixa de surpresas. Além disso, serve-nos uma mesa rica e repleta de pratos originais, na qual se espelha também a dureza de um povo habituado a lidar com momentos trágicos.

Chega-se a São Jorge por avião, via Terceira ou São Miguel, mas, se decidir integrar a visita à ilha numa tour maior pelo arquipélago, também pode acostar de barco vindo do Pico ou da Horta, por exemplo. Em qualquer dos casos, o impacto da primeira vista é sempre marcante: é uma longa cordilheira que sai do mar, como se fosse o dorso de um animal mítico, o dragão de São Jorge mas verde e cheio de arribas. Qualquer das ilhas dos Açores justifica todo o interesse que tem gerado recentemente na imprensa internacional, e esta não é menos impressionante.

Em virtude da posição central da ilha, é possível ter uma visão única ao subir ao Pico da Boa Esperança: a 1000 metros de altitude, e se o tempo o permitir, é possível espreitar o Faial, a Graciosa, a Terceira e o Pico, enquanto lá em baixo as fajãs recordam-nos que na natureza tudo o que sobe acabará por cair. Estas formações naturais comuns nos Açores resultam da queda de materiais rochosos e lava que acaba por criar uma espécie de planície que se estende até à linha de água e que os ilhéus aproveitam para cultivar. Entre a serra e o mar, criam-se nestas zonas verdadeiros microclimas que permitem, por exemplo, que se produza café na Fajã de São João ou na Fajã dos Vimes.

As duas faces da ilha

É na costa sul que se encontram os maiores aglomerados populacionais, ao lado da atividade agrícola e da antiga indústria conserveira, na linha de costa entre as Velas e a Calheta. A primeira conserva ainda um conjunto de solares e igrejas um pouco mais metropolitano do que é comum nos Açores. Saindo pela estrada que segue depois a Ponta do Topo, cruzamo-nos com as Fajãs da Boa Hora e Queimada e algumas antigas casas senhoriais, até chegarmos à Calheta.

Na face norte, região ainda mais alta e escarpada, a paisagem torna-se assombrosa. Perca-se nas estradas entre Norte Grande e Norte Pequeno, com Ribeira da Areia pelo meio, desça sempre que possível na direção do mar, como na Fajã do Ouvidor, e tenha a máquina fotográfica sempre pronta. Vai encontrar formações basálticas surpreendentes, grutas ao lado do mar e pequenas lagoas surpreendentes, como é o caso da Poça Simões Dias.

Queijo de São Jorge

Um povo que se prova à mesa

O povo de São Jorge já conheceu as agruras da natureza por demasiadas vezes: quando não eram os homens na faina do atum levados pelo mar, as inundações, as fomes de séculos passados e até a brutalidade dos sismos, muito fizeram para tornar esta gente mais sofrida do que merecia. A tradição religiosa é forte e poderá ter ajudado a que os jorgenses assistissem a tudo isto e ainda se mantenham erguidos, tal como a torre da Igreja da Urzelina que, depois de toda a aldeia ser destruída por uma erupção em 1808, resistiu estoicamente e ainda hoje se mostra ao visitante.

Este espírito resistente e combativo, materializou-se num forte cancioneiro popular mas, vocês já sabem o que vem a seguir, também numa gastronomia bastante original e saborosa. Um desses exemplos que, simultaneamente traz-nos a tradição religiosa, o espírito comunitário e a inventividade na cozinha é a Sopa do Espírito Santo. Ao longo da Quaresma a tradição diz que todos têm direito a comer um naco de pão embebido na água de cozer a carne, à qual se juntam ainda especiarias regionais.

Na linha de água apanham-se as famosas lapas que os habitantes da ilha grelham ou servem num refogado com cebola, alho e salsa, mas também caranguejos, cracas e amêijoas. A mesa só é levantada depois de servido o fabuloso queijo de São Jorge ou, para os gulosos, os “bichos de espécie”. Se apreciar a mais famosa exportação da ilha, na Cooperativa da Beira poderá encher a mala para o caminho de regresso a casa e visitar o processo de produção.

Onde o Santo Cristo convive com surfistas

Se a visita às fajãs é inevitável, porque elas realmente fazem parte da paisagem da ilha, há pelo menos uma que tem que estar no topo da sua lista de pontos a visitar: a do Santo Cristo. É com certeza a mais bonita e famosa, com uma lagoa lindíssima rodeada de escarpas, e é um riquíssimo habitat natural para aves e até para uma espécie de amêijoa que só existe aqui.
É um dos locais mais remotos dos Açores, com eletricidade a gerador e poucos habitantes permanentes. O percurso pedestre faz-se através da Caldeira de Cima e vale a pena, nem que seja só para dar um mergulho nas águas quentes da lagoa. Ao largo encontramos um santuário do bodyboard e do surf, procurado por praticantes vindos de todo o mundo. Se sentir o chamamento do mar e sentir curiosidade pelas baleias e golfinhos que passam aqui perto, volte para a encosta sul e apanhe um dos cruzeiros turísticos que, conforme as épocas do ano, saem regularmente da Calheta.

Good Year Kilometros que cuentan